Portugal tem um recorde nos Óscares: o do país que mais vezes propôs títulos à categoria de Melhor Filme Estrangeiro sem ter conseguido uma nomeação. Mesmo assim, sabe que já houve dois portugueses premiados pela Academia e um ator a ganhar a estatueta dourada por uma personagem do nosso país?
Portugal e os Óscares têm andado sempre de costas viradas.
Se dúvidas houvesse, há um facto que diz tudo: o nosso país é aquele que mais vezes submeteu títulos à nomeação de Melhor Filme Estrangeiro (nada menos que 34 vezes, a começar em 1980) sem ter conquistado a nomeação uma única vez que fosse. O mais recente a não chegar ao fim foi «São Jorge», de Marco Martins.
Também as curtas-metragens de animação se vão tentando aproximar do troféu, mas ainda sem sucesso: em 2006, por exemplo, «História Trágica com Final Feliz», de Regina Pessoa, esteve na «short-list» de 10 filmes nomeáveis, mas não chegou à lista final.
Mas a verdade é que a Academia já distinguiu talentos lusos. Carlos de Mattos é o principal, tendo sido distinguido duas vezes pela Academia de Artes e Ciências de Cinematográficas de Hollywood com certificados especiais, naquelas cerimónias dedicadas aos galardões técnicos de que são apenas apresentados excertos durante a cerimónia de entrega de prémios que vemos anualmente.
Carlos de Mattos nasceu em Luanda em 1952 e foi viver para os EUA aos 18 anos, desenvolvendo aí actividade importante na área tecnológica. Recebeu o primeiro «Technical Achievement Award» em 1983, em parceria com Con Tresfons, Adriaan De Rooy e Ed Phillips pela criação e concretização da Tulip Crane, uma grua utilizada em filmes como «E.T. O Extraterrestre».
Em 1986 recebeu um «Scientific and Engineering Award», em parceria com Ernest F. Nettman e Ed Phillips, pela criação de uma câmara de controle remoto utilizada em filmes como «África Minha» e «Cotton Club».
Já o célebre dramaturgo Christopher Hampton, apesar de ser visto por todos como britânico, nasceu na verdade na ilha do Faial, no arquipélago dos Açores, mudando-se muito novo para o Reino Unido onde faria carreira, sem qualquer ligação ao país de origem. Enquanto argumentista ele ganhou o Óscar de Melhor Argumento Adaptado por «Ligações Perigosas» em 1989 e foi nomeado ao mesmo troféu por «Expiação» em 2008.
Mas Carlos de Mattos e Christopher Hampton fizeram praticamente toda a sua vida e carreira fora de Portugal. Haverá algum português sequer nomeado com carreira relevante no nosso país? Há apenas um: o diretor de fotografia Eduardo Serra.
Ele nunca ganhou mas já foi nomeado duas vezes para o Óscar, pelo seu trabalho em «As Asas do Amor» (1997) e «Rapariga com Brinco de Pérola» (2003). Em Portugal, assinou a fotografia de filmes tão importantes como «Sem Sombra de Pecado» e «A Mulher do Próximo», de José Fonseca e Costa, «O Processo do Rei», de João Mário Grilo, «Amor e Dedinhos de Pé», de Luis Filipe Rocha, e «O Delfim», de Fernando Lopes.
Mas mesmo em filmes norte-americanos, Portugal esteve presente. Em 2015, «Feral» chegou efetivamente à nomeação na categoria de Melhor Curta-Metragem de Animação: embora fosse um filme norte-americano, ele foi realizado por Daniel Sousa, um português de origem cabo-verdiana, que viveu em Portugal até aos 16 anos, rumando depois aos EUA onde hoje vive como animador independente e professor.
Já no ano passado, dois canadianos luso-descendentes chegaram finalmente à tão ambicionada nomeação, ambos pelo filme «A Forma da Água»: Luis Sequeira, filho de pais portugueses da zona de Aveiro e que mantém dupla nacionalidade, esteve nomeado para Melhor Guarda-Roupa, e Nelson Ferreira, cujos pais são da zona da Mealhada, partilhou com Nathan Robitaille a nomeação para Melhor Montagem de Som (outrora designada de Melhores Efeitos Sonoros). Perderam respetivamente para "Linha Fantasma" e "Dunkirk".
Caso emblemático é também o do filme «Lobos do Mar», de Victor Fleming, pelo qual o incontornável Spencer Tracy ganhou o primeiro Óscar de Melhor Ator ao interpretar o pescador português Manuel (na imagem), em que até tentava, de forma algo sofrível, cantar algumas canções em português.
E não esquecer que o documentário «Portugal», integrado na popular série de documentários «People & Places» que a Disney produziu na década de 50, foi nomeado em 1958 ao Óscar de Melhor Curta-Metragem Documental de Imagem Real.
A língua portuguesa, claro, esteve presente em algumas nomeações de filmes brasileiros, nomeadamente nas designações em várias categorias dos recentes «Cidade de Deus» e «Central do Brasil». Porém, o único filme falado na língua de Camões a receber um Óscar foi o belíssimo «Orfeu Negro», em 1960, realizado em Terras de Vera Cruz pelo francês Marcel Camus. É uma co-produção entre a França, o Brasil e a Itália, que adapta a peça «Orfeu da Conceição», de Vinicius de Moraes, com música de António Carlos Jobim e Luis Bonfá. O filme foi um enorme êxito internacional, ganhando também a Palma de Ouro do Festival de Cannes.
Mais recentemente, claro, em 1994, o filme espanhol «Belle Époque», rodado em grande parte no nosso país, conquistou o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, com Portugal a merecer uma palavra de agradecimento no discurso do realizador do filme, Fernando Trueba.
Finalmente, sem ser falado em português mas adaptado de uma obra fundamental da literatura nacional da autoria de Eça de Queiroz, distinguiu-se «O Crime do Padre Amaro», nomeado ao Óscar de Melhor Filme de Língua Não Inglesa em 2003 pelo México.
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